Antigone: norm and transgression in Sophocles and Hélia Correia
Resumo
É paradigmática a determinação de Antígona, a jovem princesa que
ousou desafiar o poder instituído em nome de valores como a eusebeia ou a philia,
numa atitude heróica que lhe custou a própria vida. A literatura e os palcos portugueses
recuperaram de modo reiterado esta personagem modelar, de forma especial
no século XX, e em particular durante a vigência do regime salazarista, como
símbolo de uma liberdade desejada, mas veladamente reclamada. Hélia Correia,
fascinada pelos textos e pelas figuras da Grécia antiga, redesenhou também a filha
de Édipo, no final do século passado (cf. Perdição: exercício sobre Antígona): “tendo‑
-a tomado ao colo desde tenra idade”, como afirma, conferiu-lhe uma tonalidade
mais pessoal, mais intimista, mas não menos contestatária - a sua rebeldia, a sua
transgressão à norma acentua-se ao nível do privado e do familiar, ao nível do universo
feminino, essencial na escrita heliana. A desconstrução do modelo sofocliano,
cujo núcleo é, todavia, claramente reconhecível, evidencia a plasticidade dos
mitos clássicos, sempre abertos a renovadas interpretações que os tornam perenes e
significativos nas mais diversas épocas e locais.